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sexta-feira, 4 de março de 2011

Tripé

Para quem está acostumado com as minhas piadinhas que atraem leitores, queria dizer que hoje eu não vou tratar do famoso tripé que faz tanto sucesso nos filmes pornôs.
Não! Hoje o assunto é bacana, mas agora estou pensando em outro tripé... desculpa aí.

Muito se fala em Freud, Jung e a galera das antigas, mas eu adoro muito um teórico da Psicologia que enriqueceu minha vida pessoal e profissional com o que eu apelidei de "A Teoria do Tripé".
Chama-se Tom Andersen. Está velho, mas vivo, e mora na Noruega.
E este cara diz o seguinte (Vou traduzir para a linguagem leiga, ok? Nem tudo é tão óbvio e simples):


A vida de todos é regida por um tripé, formado pelo PENSAR, AGIR e SENTIR. Eles trabalham juntos para fazerem a gente tomar decisões e se comportar no mundo.
Mas... sempre tem um "pé" que é mais curto, capenga. E é justamente este "pé" deficiente o motivo do sofrimento trazido pelas pessoas em terapia e também é ele que precisa ser fortalecido para que a cura terapêutica possa ocorrer.

Ou seja, a cura está na falha, na sombra, naquilo que não exercitamos.


Para Tom Andersen a falha no tripé pode provocar 3 situações:
  • Tem gente que age muito, sente muito, mas não pensa.
Este é o tipo de pessoa que casa por impuslso porque está apaixonado há uma semana, escolhe uma faculdade porque acha que vai amar o curso, decide mudar de cidade porque sente que vai ser muito feliz em outro lugar, termina um casamento de anos porque sentiu que não devia mais continuar, larga o emprego porque teve uma briga com o chefe. Conhece gente assim? São pessoas que não tem argumentação teórica para basear suas ações.
-Por quê você se separou?
-Ah, porque me deu uma "coisa" e eu achei que devia.


Barato Total (G. Gil)
Quando a gente tá contente
Tanto faz o quente, tanto faz o frio, tanto faz
Que eu me esqueça do meu compromisso
Com isso ou aquilo que aconteceu dez minutos atrás
(...)
Quando a gente tá contente
Nem pensa que está contente
Nem pensar que está contente a gente quer
Nem pensar a gente quer, a gente quer
A gente quer, a gente quer é viver

 Uma pessoa dessa quando vai para a terapia deve trabalhar bastante a parte do pensamento porque é nele que está a solução para estas paixões desenfreadas. O pensamento será o salvador, diminuindo a potência deste motor sentimentalóide que a leva a agir indiscriminadamente. Ele pode até coninuar agindo, mas precisa entender as razões.

Ao chegar na terapia, a pessoa vai querer chorar, pintar, colorir, contar mil histórias de mil brigas, mas, seja duro!! Fique firme na argumentação teórica querendo entender tim-tim por tim-tim porque foi que ela agiu desta ou daquela forma.
Ajude-a a construir o caminho do pensamento racional. Dá um trabalho danado!
  • Tem gente que pensa muito, sente muito, mas não age.
"Eu sempre quis estudar, sempre quis sair de casa, estou há anos querendo me separar, não consigo salvar meus filhos de um pai alcoólatra e agressivo, acho que vou morrer sem ter feito o que eu queria".

Estas são as frases usadas por este segundo tipo de gente. Em geral muito bem argumentadas, cheias de explicações dos prós de dos contras em ficar ou sair, cheias de choros e lamentações, mas... sem nenhuma ação.
A pessoa está paralisada nos seus pensamentos, afogada por sentimentos petrificantes, e sofre demais por não conseguir agir. Se sente fraca e incapaz.


Blackbird (Lennon e McCartney)
Blackbird singing in the dead of the night
Take these broken wings and learn to fly
All your life
You were only waiting for this moment to arise.

Blackbird singing in the dead of the night
Take these sunken eyes and learn to see
All your life
You were only waiting for this moment to be free.


A terapia está em trabalhar a ação. Incentivá-la a ser mais impulsiva, mais ousada.
Segundo Tom Andersen, é a ação que fará com que está pessoa saia da inércia que compromete a sua vida. E agir pode ser difícil prá caramba!!!
Então como convencê-las a agir? Investigando suas convicções e desejos. E procurar desejos dentro da apatia é duro. Processo longo!
No entanto, é uma enorme prazer ver o paciente tomando as rédeas de suas decisões. Andando para sua auto-realização, mudando o rumo da sua vida. Lindo.

  • Tem gente que pensa bem, age bastante, mas não sente.
Estas para mim são as pessoas mais difíceis de lidar porque são dotadas de um enorme poder de argumentação téorica. Gostam de explicar porque agiram de tal forma, querem entender o porquê de todas as minhas falas dentro da sessão e exibem os seus feitos e suas conquistas baseadas na mais pura razão. Definem metas, agem pela lei da mais valia. E costumam agir bem.
Têm filhos, casam, escolhem a profissão e definem prioridades baseadas em razões objetivas.
Costumam ser muito bem sucedidos, mas ficam distantes dos afetos e chega um dia em que não conseguem mais acessar os sentimentos, não reconhecem seus desejos. E passam a achar a vida sem graça e sem sentido.
A reaproximação com os afetos é difícil e pode ser assustadora.

Mas não existe nada mais lindo e emocionante do que os sentimentos virem (serena ou passionalmente) salvar um coração embrutecido. Como é bom ser psicóloga e poder assistir isso de camarote!!

Não gosto de generalizar porque esta informação não define nada, mas minha experiência mostra que este último grupo não chega em sofrimento no consultório. Não choram e nem são afetados por depressão. Sofrem mais de transtornos somáticos como crises de ansiedade, sindrome do pânico e fobias.

Para explicar este drama numa música, eu fiquei na dúvida entre "Explode Coração" e "O samba do grande amor", mas aí lembrei da incompreensão do amor descita nesta daqui:

O que será (C. Buarque)
(...)
O que será, que será?
Que vive nas idéias desses amantes
Que cantam os poetas mais delirantes
Que juram os profetas embriagados
Que está na romaria dos mutilados
Que está na fantasia dos infelizes
Que está no dia a dia das meretrizes
No plano dos bandidos dos desvalidos
Em todos os sentidos...
Será, que será?
O que não tem decência nem nunca terá
O que não tem censura nem nunca terá
O que não faz sentido...



Descobrir qual é o pé manco pode demorar muito tempo.
Eu, como paciente, fiz o trabalho para a minha última terapeuta logo nos primeiros minutos: "Oi tudo bem, você pode me ensinar a pensar?"
Sou uma paciente exemplar e fiz bem minha lição de casa.

Agora façam a de vocês.
Usem o Carnaval para pensar nos seus tripés e nas pessoas que vocês conheçem que se encaixam perfeitamente nestas descrições acima.
Depois me contem o que descobriram, ok?


3 comentários:

  1. Eu penso, ajo e sinto...

    Ah... faço terapia também! :)
    Beijo Clau!

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  2. Tatiana, delícia é ouvir isso de alguém que não me conhece pessoalmente. Sim, porque os elogios dos amigos são sempre suspeitos...
    Obrigada!

    ResponderExcluir

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